Um dos maiores desafios encontrados pelos professores é, sem dúvida, ensinar crianças e adolescentes nos tempos atuais. Em contrapartida, para os pais também não têm sido fácil o processo de educar, com cada vez mais afazeres no dia a dia, dedicar tempo de qualidade para as relações e ensinar com afeto são processos que demandam sabedoria e paciência. Esses foram alguns dos assuntos pautados pelo psicólogo, professor e escritor baiano Alessandro Marimpietri, que palestrou nesta quinta-feira, 15, no Seminário dos Professores do Colégio Mauá.
No bate-papo realizado com os docentes, o doutor em educação elencou temas atuais e que, segundo ele, devem ser traduzidos em sala de aula. “Falamos sobre o papel da afetividade na educação do século 21, quais são as características que se diferem do século 20, por exemplo, e que nos obrigam, enquanto professores, a repensar modelos de educação para fazer frente a essa realidade”, explica.
Posteriormente, em evento realizado junto à imprensa da região, Marimpietri contou sobre sua experiência, novos cenários e a palestra realizada na escola. Conforme o psicólogo, a afetividade foi um tema historicamente secundarizado na educação e que hoje ganha poder de centralidade. Isso porque as relações de convivência e troca que ocorrem em sala de aula são primordiais para formar bons cidadãos. “Em tese a educação está democratizada, as pessoas não vão à escola somente para obter informações, elas precisam ir para aprender a conviver, fazer uma sociedade melhor e saber utilizar essas informações”, destaca.
Ele defende que o processo educativo deve investir no ensino através da troca de experiência, bem como nas relações de qualidade. “Tive acesso a uma pesquisa que perguntava às pessoas o que eles lembram do tempo da escola, a imensa maioria lembrava das relações e poucos dos aspectos conceituais. Ou seja, a escola é um lugar de encontro, onde acontecem trocas que nos dão condição para a aprendizagem”, frisa o psicólogo.
Nesse sentido, segundo Alessandro, é fundamental fazer esse movimento de mudança para ver resultados na esfera social. “Nosso papel é colocar essa pauta em foco para que as escolas possam construir uma ambiência democrática, respeitosa e tolerante. Assim, esse ambiente pode ser uma referência para a construção de uma sociedade mais justa, igualitária e menos violenta”.
PARENTALIDADE – A relação entre pais e filhos também foi um dos temas tratados. A dificuldade de lidar e compreender a nova geração de crianças e adolescentes é iminente, portanto, construir relações que sejam firmes, mas não autoritárias, amigáveis, mas não permissivas, é uma das principais preocupações dos pais que o psicólogo visualiza em seus atendimentos clínicos. “Temos hoje em dia uma geração de pais muito mais ocupados, culpados e preocupados. Essa angústia faz com que tenham dificuldade em construir uma relação com firmeza, gentileza, com autoridade e que consigam aliar o lado afetivo e amistoso, mas sem se confundir com uma amizade”.
Ele observa que esse movimento é desencadeado por um processo natural da sociedade. “Somos as testemunhas oculares de uma transição, havia um paradigma que está acabando e outro está sendo criado. Com isso, estamos entre algo que está sendo finalizado e algo que ainda não se estabeleceu. Assim, é natural que eles se sintam perdidos por não quererem repetir modelos que já não cabem mais”.
Alessandro destaca que a hierarquia é fundamental para estabelecer limites nas relações parentais. “Não dá para um pai ser amigo do filho, ele pode ter uma relação amistosa, mas amigos operam socialmente do mesmo lugar, e para educar temos que estar em um outro lugar, é a alteridade que é formativa. Não é fácil ser pai no século 21, porque não há referências, o que funciona hoje, amanhã já não funciona mais”, salienta.
Por outro lado, ele visualiza um bom cenário. “A parte boa é que por estarmos em uma transição, nós temos mais chance de invenção, podemos reescrever essa história de uma maneira mais livre, o que não aconteceria há 40 anos”, exemplifica o psicólogo.
TECNOLOGIAS – Outro assunto recorrente nas palestras de Alessandro é o acesso sem precedentes de jovens e crianças às telas. Ele explica que é necessário se adequar a essa nova realidade. “O fenômeno do digital não vai retroceder, ele está posto, o grande desafio enquanto pais e professores é ver o que vamos fazer com isso”, frisou. Ele conta que é necessário dar um passo para trás e avaliar. “A primeira ideia que precisamos desconstruir é dos ‘nativos digitais’. Não é porque eles nasceram nessa era, que estão preparados para lidar com isso”, avalia.
Além disso, ele explica o quão danoso o livre acesso pode ser e quais as consequências. “O digital tende a hiperestimular dimensões do nosso cérebro que precisam de estímulo, mas não em excesso, por outro lado eles deixam de estimular dimensões necessárias para um desenvolvimento saudável. Portanto, podemos dizer que o excesso do digital é danoso no crescimento de crianças e adolescentes. Para isso, precisamos filtrar conteúdos, lidar com limites de tempo, conseguir fazer com que o digital não roube a experiência do analógico”, pondera.
Por fim, o escritor fez um alerta para a comunidade escolar. “Esse é um fenômeno sério, urgente, não cabe mais a pais e professores se darem ao luxo de não entenderem a gravidade do problema, pois a consequência disso para essa geração já existe”, disse.
O PALESTRANTE – Alessandro é natural da Bahia e trabalha há mais de 20 anos fazendo atendimento clínico para crianças, adolescentes e famílias, além de realizar conferências sobre temas relativos à infância, adolescência, educação e saúde em escolas de todo o Brasil. Marimpietri é autor dos livros “Quando somos um só” e “O que é o tempo?”, ambos publicados pela Solisluna Editora.
Crédito fotos: Regina Colombelli
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