Na última terça-feira, 16, um forte temporal atingiu o Rio Grande do Sul, e a região do Vale do Rio Pardo foi uma das mais afetadas. Além dos danos materiais causados pela ventania e fortes chuvas, desde então, diversas localidades da região ainda estão sem energia elétrica. Nesse momento surge o questionamento de quais são os direitos de quem sofreu algum prejuízo pela falta de luz e se é possível reaver o dano.
A advogada Angeline Kremer Grando, sócia responsável pelo Departamento Cível do BVK Advogados e especialista em Direito do Consumidor, explica que há amparo legal, conforme regras da Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL), que regula o setor de energia no país. “A demora no restabelecimento da energia é um problema, pois a agência reguladora estabelece prazos limites de tolerância. Em religação de urgência, como nos casos de pessoas que utilizam aparelhos para fins de sobrevivência, o prazo é de quatro horas na zona urbana e oito horas na rural. Mas se estamos falando de uma religação normal, seriam 24 horas na área urbana e 48 na rural”, destaca a advogada.
Conforme a profissional, mesmo sendo um acontecimento atípico, a empresa deve arcar com danos causados aos consumidores. “No direito existe um termo popular que se chama caso fortuito ou força maior, que são os eventos completamente imprevisíveis. Contudo, as decisões judiciais cunharam o termo fortuito interno, para casos que devem ser previsíveis em razão do modelo de negócio, e mesmo nesses casos a empresa deve sim responder”, argumenta Angeline.
A advogada destaca que, como os desastres naturais estão cada vez mais comuns, é necessário que as empresas fornecedoras de energia tenham um plano para essas situações. “Eventos da natureza não são mais imprevisíveis, assistimos acontecer a todo o momento. Dentro das concessionárias é necessário ter um plano de contingência, que não subjuguem o consumidor a ficar uma semana sem energia elétrica. É um descaso ainda não termos uma estrutura que atenda de forma digna o nosso consumidor”, frisa a profissional.
Para as ocorrências que vão além dos aparelhos eletrônicos, como a perda de alimentos, estoque de empresas, por exemplo, também há medidas legais a serem tomadas, mas é fundamental que os consumidores consigam reunir provas. “Sempre quando falamos sobre processos judiciais precisamos ter um olhar sobre a prova que se consegue produzir. É importante que existam protocolos da tentativa de atendimento administrativo, aquelas ligações para o restabelecimento da luz, e cada um desses precisa ser anotado pelo consumidor”, explica Angeline.
Além disso, os registros fotográficos com datas são evidências sólidas. “Se o usuário tem fotos com o freezer cheio, se passam três dias consecutivos e o alimento vai fora, por exemplo, já resta claro que houve prejuízos. Com o registro desses detalhes, preferencialmente com data, e os protocolos de atendimento, é possível entrar com um processo judicial.” Angeline acrescenta que, para o caso de pessoas que tiveram eletrodomésticos queimados por instabilidade na tensão, a orientação é contatar diretamente com a RGE.
Para além do dano material, a advogada visualiza questões muito maiores por conta da falta de energia. “A maioria dos danos transcendem o liquidificador ou o micro-ondas queimado. São casos de freezers com comida para a subsistência da família, dos pequenos negócios que vão entrar em falência por não conseguirem dar a volta por cima diante da perda de todo o seu estoque”, explica.
Danos morais – O consumidor lesado, além de solicitar ressarcimento pela perda material, também pode buscar amparo na linha dos danos morais, conforme a advogada. “Se o prazo para o restabelecimento era de 24 horas e ele aconteceu em 36 horas, proporcionalmente ao evento, não vai enquadrar em dano moral, pois existe uma análise por parte do Judiciário. Mas, uma situação em que as pessoas ficaram quatro, cinco dias, até uma semana sem energia, aqui sim precisamos seguir uma linha punitivo-pedagógica, pois extrapolou muito o prazo legal, afetando diretamente na dignidade humana dos consumidores”, salienta Angeline.
No caso dos processos judiciais, Angeline alerta sobre os custos com o processo, que podem ou não ser ressarcidos. “Os honorários de quem busca um advogado privado não podem ser cobrados da parte que perde o processo, pois isso é uma escolha do consumidor”, salienta. Para que o direito seja buscado sem custos, de acordo com a advogada, a indicação é procurar a assistência jurídica gratuita. “Dá pra buscar o juizado especial cível, que é gratuito, ou a defensoria pública”, finaliza.
Crédito foto: Guilherme Figueiredo
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